O que poderá ver
quem um dia cegou?
Será o seu prazer
um indeterminável voo?
Eu, porém, cego não sou:
persegue-me uma luz,
como fosse uma cruz.
Será porque vejo
que tenho essa liberdade
de sentir esse desejo
de tal infelicidade?
Bem visto, eu vejo
a vida num ensejo,
vida que tanto aborrece
quem nesta vida padece
de tristeza mal merecida.
E porque vejo;
ficou-me na memória
aquele último beijo
dado sem qualquer glória
na face da criança sem sorte
que não teve o pão presente
no dia da sua morte
(essa criança também era gente).
DEUS, diz-me lá:
- AQUI ALGUÉM SENTE! SERÁ?
se NÃO, leva no vento
este estado descontente
do meu pensamento.
Faz-me ficar calado
ou traz-me o passado
de quem eu deixei matar.
Saberei o que digo?
Ou estarei só a falar comigo?
(Não Te tenho como inimigo).
Mas, porque existe este fim?
Tudo é contrário assim:
deixa-me morrer antes a mim.
Em Ti eu pus esperança,
mas no meu grito agora se descobre:
que perdi a confiança.
Faz de mim, rico, um pobre
e depois: agora sim,
faz-me o mesmo que à criança
dá-me idêntico fim
para eu acreditar em Ti.
Se Tu não és cego, Oh Deus!
Dá-me a sentir essa morte,
não leves a criança, mas eu…
para divisar essa fome forte.
Sou só um simples mortal,
não Te posso julgar afinal!…
© Jorge Oliveira
Publicado no RL em 04/08/2008
Código do texto: T1111858
CEGUEIRA DE DEUS!...
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